sexta-feira, 11 de março de 2011

Saint Germain


SAINT GERMAIN - O HOMEM PRODIGIOSO DA EUROPA

- Você teria a bondade de me dizer

– indagou a condessa v. Georgy

– se seu pai esteve em Veneza por volta de 1710?
- Não, madame – replicou o conde, indiferente -,

perdi meu pai há muito mais tempo; mas morei em Veneza no final do século passado e no princípio deste século; tive a honra de fazer-lhe a corte nesta época...
- Queira perdoar-me, mas isto é impossível;

o conde de Saint Germain que conheci naquela ocasião contava pelo menos 45 anos de idade, e você não aparenta mais do que essa idade.
- Madame – replicou o conde, sorrindo –, eu sou muito velho.
- Mas então você deve ter quase cem anos de idade.
- Isto é bem possível – replicou Saint Germain.

Ele foi o Homem Prodigioso da Europa

– isto nós sabemos.

Mas teria sido ele o terceiro filho desaparecido do príncipe Ferenc Rakoczy II, soberano húngaro destronado?

Ou teria ele, como o Mestre Ascenso Saint Germain, materializado um corpo a fim de parecer descendente da casa real da Hungria?

Seu nascimento, sua morte e sua verdadeira identidade estão envoltos em mistério.
Contudo, uma coisa é certa: ele era totalmente visível nas cortes reais

– e invisível!

Viram-no “desaparecer” ao deixar os aposentos particulares do rei e da rainha em Versalhes. Sem dúvida, seus feitos como conde de Saint Germain são verdadeiros pontos de exclamação nos diários de notáveis do século XVIII.
Nas memórias da corte de madame de Pompadour, do príncipe Karl de Hesse e de madame d’Adhémar,

ele é lembrado como l’homme extraordinaire.

Descrito com esguio, mas bem proporcionado, de estatura mediana e traços agradáveis, seus olhos eram encantadores e cativavam aqueles que porventura os observassem.

Ele usava diamantes em todos os dedos

– e nas fivelas dos sapatos.

Mesmo depois da extraordinária conversa com a condessa de Georgy, em 1767, ele não envelheceu.
Madame d’Adhémar encontrou-o em 1789.

“Era ele mesmo, em pessoa... sim, com a mesma fisionomia que tinha em 1760, enquanto meu rosto estava coberto de sulcos e marcas da decrepitude.”
Um homem que não envelhecia, um mistério.

Aparentemente, nada havia que ele não pudesse fazer.

Foi admirado como grande filósofo, diplomata, cientista, curandeiro, artista e músico.

Conhecia tão profundamente a história que parecia ter realmente vivenciado os fatos que relatava. Madame de Pompadour lembra que “vez por outra ele recontava anedotas da corte de Valois (casa real francesa de 1328 a 1589), ou de príncipes ainda mais antigos, com tamanha exatidão de detalhes que praticamente criava a ilusão de que ele fora testemunha ocular daquilo que narrava.”
Seu conhecimento abrangia não apenas o tempo passado, mas estendia-se também a todo o globo.

“Ele havia viajado o mundo inteiro”,

escreveu de Pompadour,

“e o rei ouvia de bom grado as narrativas de suas viagens pela Ásia e África, e suas histórias sobre as cortes da Rússia, da Turquia e da Áustria.”
Ele falava pelo menos doze idiomas com tanta fluência que era considerado oriundo dos muitos lugares que visitava. Dentre eles, incluíam-se o francês, o alemão, o inglês, o italiano, o espanhol, o português, o russo e os idiomas do oriente.

“Os sábios e os estudiosos orientais comprovaram o conhecimento do conde de St. Germain”, escreveu uma condessa na corte de Luís XV.

“Os primeiros consideraram-no mais versado nos idiomas de Homero e Virgílio do que eles mesmos; com os últimos, ele falava em sânscrito, chinês, árabe, com uma mestria que indicava sua prolongada permanência na Ásia.”
Ele esteve com o general Clive na Índia, em 1755, onde disse ter aprendido a fundir jóias.

Na corte do Xá da Pérsia, de 1737 a 1742, monsieur de St. Germain exibiu seus talentos na precipitação e aperfeiçoamento das pedras preciosas, particularmente dos diamantes.
Ele também viajou ao Japão, segundo seu relato a madame d’Adhémar.

É impossível saber que outros lugares ele visitou, pois St. Germain aparecia e reaparecia de maneira imprevisível por toda a Europa.

No entanto, havia um propósito por trás de todos os atos do Homem Prodigioso.

E suas maravilhas iam muito além da simples genialidade.
Ele tinha habilidades curativas e utilizava as ervas, combinada com seus hábitos alimentares simples, que prolongou a vida de St. Germain.

O príncipe Karl de Hesse escreveu: “Ele tinha o conhecimento total das ervas e plantas, e havia criado medicamentos dos quais fazia uso constante, e que prolongaram sua vida e sua saúde.”
Ele deu um elixir a madame v. Georgy que, durante 25 anos, fê-la aparentar ter 25 anos, segundo relatos da época. Ela viveu tanto tempo, que passou a ser chamada de a velha condessa eterna.
Saint Germain também prescreveu um chá de ervas para manter a saúde do exército russo, e ofereceu-se para curar em três dias Giacomo de Casanova de uma enfermidade aguda.

O pândego, contudo, declinou das drogas, pois não confiava em ninguém, nem mesmo no mais confiável dos alquimistas, pois já enganara muitos deles.
O conde era um virtuose no piano e no violino, bem como pintor, poeta e artesão consumado. Aonde quer que fosse, ele era saudado como estudioso, estadista e bom contador de estórias. Formou sociedades secretas, ocupou uma posição proeminente dentre os rosacruzes, os maçons e os cavaleiros templários da época, além de escrever o clássico do ocultismo The Most Holy Trinosophia, utilizando uma mistura de idiomas modernos e hieróglifos ancestrais. Monsieur de Saint Germain nunca confirmou nem negou tudo que se dizia a seu respeito. Ao contrário, ele respondia com um sorriso ou uma atitude evasiva estudada. Sua habilidade como alquimista foi louvada por Luís XV, que lhe ofereceu um laboratório e uma residência no castelo real de Chambord. E suas demonstrações alquímicas tinham algo de miraculoso, segundo seus cronistas.
Madame du Hausset, femme de chambre de madame de Pompadour, escreveu extensamente a respeito dos prodígios de Saint Germain. Suas memórias contam-nos que, em 1757, “o rei ordenou que lhe trouxessem um diamante de tamanho médio que tinha um defeito. Após mandar pesá-lo, sua majestade disse ao conde: ‘O valor deste diamante como está, e com este defeito, é de seis mil libras; sem a imperfeição, ele valeria pelo menos dez mil. Você se encarregaria de me fazer ganhar quatro mil libras? St Germain examinou a pedra com muita atenção e disse: ‘É possível; isto pode ser feito. Eu o devolverei dentro de um mês.”’
“Na ocasião aprazada, o conde de St. Germain trouxe de volta o diamante sem um defeito e deu-o ao rei. A pedra estava envolta numa tela de amianto, que ele retirou. O rei mandou pesá-la imediatamente e verificou que seu peso diminuíra muito pouco. Sua majestade então enviou o diamante para seu joalheiro... sem contar nada do que acontecera. O joalheiro ofereceu-lhe 9.600 libras pela pedra. O rei, entretanto, pediu o diamante de volta, e disse que iria guardá-lo como curiosidade.”
Em uma corte européia, este Merlim do século XVIII pediu que lhe trouxessem vários ossos de um cervo e galhos de uma árvore. De posse desses “ingredientes”, entrou sorrateiramente na sala de jantar de um grande palácio. Algum tempo depois, reapareceu e instou os convidados a acompanhá-lo. Quando as portas se abriram, todos ficaram estarrecidos: no interior do recinto havia uma floresta com cervos pastando em torno de uma mesa carregada de iguarias de alta cozinha.
Com a mesma facilidade, Saint Germain realizou o sonho do alquimista – a transformação de metais vis em ouro.
Em 1763, o conde Karl Cobenzl escreveu em uma carta que Saint Germain realizara “bem diante de meu olhos... a transmutação de ferro em um metal tão belo quanto o ouro, e no mínimo igualmente bom para todos os trabalhos de um ourives”. O marquês de Valbelle relatou ter visto Saint Germain transformar uma moeda de prata de seis francos em ouro.
Casanova escreveu acerca de uma experiência análoga, na qual Saint Germain transformou uma moeda de doze soldos em uma moeda de ouro. Contudo, na sua opinião, aquilo não passara de um truque, e ele insinuou que Saint Germain havia substituído uma moeda pela outra. Este repreendeu-o: “Aqueles que são capazes de nutrir dúvidas com relação ao meu trabalho, não são dignos de dirigir-me a palavra” e, com uma reverência, mandou que o descrente saísse imediatamente do seu laboratório, e para sempre.
O conde não era apenas um alquimista, mas um adepto oriental, comportando-se como um iogue meditando na postura de lótus e tranqüilizando animais com o seu espírito ardente.
Um admirador holandês, J. van Syesteyn, escreveu: “Às vezes ele entra em transe e, quando novamente se recuperava, dizia ter passado o período inconsciente em terras longínquas; outras vezes, ele desaparecia durante um tempo considerável e de repente reaparecia, deixando claro que estivera em outro mundo, em comunicação com os mortos. Além disso, ele se orgulhava de sua capacidade de domesticar abelhas e fazer com que as cobras ouvissem música.”
Mestre dos mestres – ele não era um charlatão. Tampouco era um produto da imaginação. Saint Germain é citado nas cartas de Frederico o Grande, Voltaire, Horace Walpole, Casanova e está presente inclusive nos jornais da época – The London Chronicle, de junho de 1760, um jornal florentino, Le Notizie del Mondo, em julho de 1770, e também na Gazette of the Nederlands.
Os segredos de estado de diversos países lhe foram confiados, mostrando gozar da confiança duradoura daqueles com quem lidava na corte. Ele foi enviado em missões de negociação por Luís XV, um dos primeiros a praticar a diplomacia secreta. Os arquivos da França contêm evidência de que estadistas prussianos, holandeses e ingleses de seu tempo consideravam o conde uma autoridade em muitos setores.
“Ele parecia mais intimamente familiarizado com os segredos de cada corte do que o chargé d’affaires do rei”, escreveu madame de Pompadour. Voltaire observou que Saint Germain conhecia os segredos dos primeiros-ministros da Inglaterra, França e Áustria.
Conquanto muitos suspeitassem que ele era um trapaceiro e vigarista, estava claro que o dinheiro não era o seu objetivo. Ele sempre viveu bem, e madame de Pompadour escreve que o conde presenteou o rei com belos quadros e distribuiu “diamantes e jóias com surpreendente prodigalidade”. Sem dúvida, não seria esta a atitude de um caçador de tesouros.
Na verdade, ele era um filantropo. O príncipe Karl de Hesse descreveu-o como “o amigo da humanidade, que ansiava pelo dinheiro apenas para dá-lo aos pobres; um amigo dos animais, seu coração preocupava-se tão-somente com a felicidade dos outros”.
“Onde quer que o conhecessem pessoalmente, Saint Germain deixava atrás de si uma impressão favorável, bem como a lembrança de inúmeros gestos de bondade e às vezes de muitos gestos nobres. Um sem-número de chefes de família pobres e de instituições de caridade foi por ele auxiliado em sigilo”, escreveu van Sypesteyn.
Em Estudos sobre a Alquimia, Saint Germain explica que na realidade ele precipitava bens para dar aos pobres. “Quando servi na Europa para dissipar parte da pobreza e da confusão que ali imperavam”, ele escreve, “utilizei a alquimia universal a fim de produzir a substância que, conquanto de natureza temporária, atendia a inúmeras necessidades humanas.”
Mas por que tantas extravagâncias na corte? O que ele estava tentando provar? O conde procurava exatamente galvanizar – com inteligência, senso de humor e sua presença imperiosa e profética – uma era que enfrentava o inevitável fim da velha ordem. Seu plano de ação consistia em estabelecer os Estados Unidos da Europa – antes que a influência sangrenta da Revolução Francesa nada deixasse de bom ou mau das casas reais da Europa.
Outro dos objetivos de Saint Germain era acelerar o progresso da ciência e da tecnologia, a fim de elevar o homem a uma capacidade de maior consciência espiritual. Vez por outra, ele representou o papel de santo padroeiro da Revolução Industrial.
O conde Karl Cobenzl testemunhou o desenvolvimento, por ele implementado, das técnicas de produção em massa, entre elas o branqueamento do linho, para que se assemelhasse à seda italiana, o tingimento e preparo de peles “que superavam todos os marroquins do mundo, e o mais perfeito curtimento; o tingimento de sedas, levada a uma perfeição até aquele momento desconhecida; o tingimento de lãs; o tingimento da madeira, nas cores mais brilhantes... com os ingredientes mais simples e, conseqüentemente, a um preço bastante razoável”.
E, acreditem ou não, Saint Germain realmente montou uma fábrica de chapéus para o conde Cobenzl! Iniciou também a produção em massa de seus inúmeros inventos, patrocinando, ao mesmo tempo, outras evoluções tecnológicas. “Sou muito necessário em Constantinopla; e na Inglaterra”, disse a um escritor de memórias, “para preparar duas invenções que vocês terão no próximo século – os trens e os barcos a vapor”.
Seu objetivo, aparentemente, era ajudar a ascensão de uma classe média, ao mesmo tempo convencendo a monarquia a realizar uma transição suave para a idade moderna. Ele realizou o primeiro de seus objetivos, mas a apatia das classes dominantes e as intrigas dos conselheiros corruptos frustraram o sucesso do último.
Os monarcas, embora admirassem os feitos miraculosos do conde, declaravam-nos “interessantes”. Sempre dispostos a deixar-se entreter por ele, esses monarcas não eram facilmente estimulados a agir. Quando se tratava de seguir os conselhos do conde, eles o ignoravam educadamente; e seus ministros, corroídos pela inveja, desprezavam-no.
Constitui um exemplo a missão secreta malograda de Luís XV. Ele enviou Saint Germain como seu emissário a Amsterdam, para negociar um tratado de paz que poria fim à guerra entre a aliança franco-austríaca e os ingleses e prussianos.
Sem demora, o embaixador francês em Amsterdam tomou conhecimento do fato, ofendeu-se porque o rei pretendia servi-se de um “estrangeiro obscuro” em seu lugar e queixou-se ao ministro do Exterior, o duque de Choiseul, que imediatamente ordenou a prisão de Saint Germain. O duque não desejava a paz, pelo menos não naquele momento, especialmente uma paz cujo crédito ele não poderia reivindicar.
No dia seguinte, diante do rei e de seu conselho, Choiseul expôs a missão, assegurando: “Estou convencido de que ninguém aqui teria a audácia de desejar negociar um Tratado de Paz sem o conhecimento do ministro das Relações Exteriores de sua majestade!”
O rei, como de hábito, escolheu o caminho de menor resistência. Não desafiou seu ministro nem defendeu Saint Germain, guardando silêncio sobre a sua participação na questão. Contudo, sua missão de paz, desacreditada, fracassou; o conde conseguiu evitar a prisão – talvez com o auxílio do rei ou, mais provavelmente, graças a sua própria presciência.
O mesmo tratamento continuou a ser ministrado sob Luís XVI, mas desta vez Saint Germain estava preparado. Em primeiro lugar, pediu uma audiência à rainha. Madame d’Adhémar estava presente e registrou a cena. Ele explicou detalhadamente a Maria Antonieta os detalhes do terror que estava por vir e implorou-lhe que alertasse Luís.
Ele disse: “Ainda se passarão alguns anos numa tranqüilidade enganosa; então, de todos os pontos do reino surgirão homens sedentos de vingança, de poder e de dinheiro; aniquilarão tudo que estiver em seu caminho... A guerra civil explodirá com todo seu horror; trará em seu rastro o assassinato, a pilhagem, o exílio. Aí irão lamentar-se por não me terem ouvido.”
Ele disse à rainha que queria ver o rei sem o conhecimento de monsieur de Maurepas, fazendo a seguinte observação a respeito do conselheiro-chefe do rei: “Ele é meu inimigo; ademais, classifico-o entre aqueles que promoverão a ruína do reino, não por maldade, mas por incapacidade”. Afirmando sua disponibilidade “às ordens de suas majestades”, monsieur de Saint Germain despediu-se da rainha.
Tencionando deixar o país, ele partiu para Paris, explicando a madame D’Adhémar que sabia que o rei iria falar com Maurepas e que não tinha desejo algum de ser lançado na Bastilha, e ter de recorrer a um milagre para sair. Ela protestou, afirmando que o rei talvez não tivesse aquela atitude. Neste caso, replicou, ele voltaria a tempo. Maria Antonieta procurou o rei imediatamente, que por sua vez interrogou madame d’Adhémar a respeito do conde, afirmando que ele “havia alarmado seriamente a rainha”. Sem dúvida, Luís pediu o conselho de Maurepas, que classificou Saint Germain de tratante; em seguida, o conselheiro ambicioso dirigiu-se imediatamente à residência de madame d’Adhémar, a fim de prender o Homem Prodigioso. Saint Germain não foi encontrado. Tão logo declarara sua intenção de trancafiar Saint Germain na Bastilha, a porta de seu quarto se abriu e o taumaturgo entrou. Aproximando-se de Maurepas, ele disse:
“Monsieur le Comte de Maurepas, o rei convocou-o para receber seus bons conselhos, e o senhor está pensando apenas em manter sua própria autoridade. Opondo-se à minha visita ao monarca, o senhor está colocando a monarquia em perigo, pois apenas tenho um tempo limitado para conceder à França, e este tempo acabou, não voltarei a ser visto aqui até que três gerações consecutivas estejam no túmulo. Disse à rainha tudo que me foi permitido dizer-lhe; minhas revelações ao rei teriam sido mais completas; infelizmente, o senhor se interpôs entre sua majestade e mim. Nada terei a reprovar a mim mesmo quando uma horrenda anarquia devastar toda a França. Quanto a essas calamidades, o senhor não irá vê-las, mas o fato de tê-las propiciado constituirá um memorial suficiente de sua pessoa... Não espere homenagens da posteridade, ministro frívolo e incapaz! O senhor estará entre os causadores da ruína dos impérios.”*
“Após dizer tudo isto de um só fôlego, Saint Germain caminhou em direção à porta, fechou-a e desapareceu”, escreve madame d’Adhémar. “Todos os esforços para encontrar o conde foram em vão.”
E a lição é aprendida com sabedoria e a duras penas: um alquimista de extrema proficiência, até mesmo o iniciado dos séculos, com a melhor das intenções e a solução para problemas globais e a ascensão e declínio das nações, deve submeter-se ao livre-arbítrio dos mortais. Ele pode aconselhar, mas não comandar; e, quando ignorado, é obrigado a retirar-se.

*Monsieur de Maurepas morreu em 1781, sete anos e meio antes da queda da Bastilha, fim simbólico do ancien régime. A história recorda-o como aquele que dissuadiu Luís XVI de instituir reformas que poderiam ter impedido a Revolução e permitido à França evitar o Reinado do Terror, passando com suavidade da monarquia para a república.
Monsieur de Saint Germain continuou a escrever cartas à rainha alertando-a da ruína iminente, mas quando a crise chegou a um determinado ponto, ele não pôde fazer mais nada para deter a revolução que vinha sendo forjada desde a morte do estadista mestre, Luís XIV.
Muitos anos depois, pouco antes de irromper a tempestade, Saint Germain encontrou madame d’Adhémar mais uma vez, nas primeiras horas da manhã, em uma capela em Récolets, Paris. Ele profetizou o fim do rei e da rainha, afirmando ser tarde demais para salvá-los. Segue-se o registro do diálogo, feito por madame d’Adhémar:
- O que eu lhe disse, e também à rainha? Que monsieur de Maurepas poria tudo a perder, transigindo em excesso. Eu fui Cassandra, ou um profeta do mal. E agora, qual a sua opinião?
- Ah, conde, sua sabedoria será inútil.
- Madame, aquele que semeia ventos colhe tempestades. Jesus assim falou no Evangelho, talvez não diante de mim, mas de todo modo suas palavras permanecem escritas, e as pessoas poderiam ter-se beneficiado com as minhas.
- Novamente! – disse, tentando sorrir, mas ele, sem atentar para minha exclamação, falou:
- Escrevi para a senhora, nada posso fazer, minhas mãos estão atadas por algo mais forte do que eu mesmo. Existem momentos em que a retirada é impossível, e outros em que Ele se pronuncia e a sentença é executada. Nós estamos entrando em um período assim.
- O senhor vai ver a rainha?
- Não, ela está condenada.
- Condenada! A quê?
- À morte!
Ah, desta vez não consegui conter um grito, pus-me de pé, repelindo o conde com minhas mãos e dizendo, com a voz trêmula:
- Ah, o senhor também! O senhor! Como, o senhor também!
- Sim, eu... eu, como Cazotte.
- O senhor sabe...
- Coisas de que a senhora nem mesmo suspeita. Volte ao palácio, vá e diga à rainha para tomar cuidado, pois este dia ser-lhe-á fatal; existe uma conspiração, planeja-se o assassinato.
- O senhor me enche de horror, mas o conde d’Estaing assegurou...
- Ele ficará aterrorizado, e irá esconder-se.
- Mas monsieur de Lafayette...
- Um balão levado pelo vento! Neste momento estão decidindo o que farão com ele, se ele será instrumento ou vítima; ao meio-dia tudo estará decidido.
- Monsieur – falei -, o senhor poderia prestar serviços inestimáveis aos nossos soberanos, se quisesse.
- E se eu não puder?
- Como?
- Sim, e se eu não puder? Achei que não deveria ser ouvido. A hora do repouso passou, e os decretos da Providência devem ser cumpridos.
- Em palavras simples, o que eles querem?
- A ruína completa dos Bourbons; eles irão bani-los dos tronos que ocupam e, em menos de um século, irão retornar à condição de simples indivíduos, em seus diferentes ramos.
- E a França?
- Reino, república, império, governos mistos, atormentada, agitada, dilacerada; dos tiranos espertos ela passará às mãos de ambiciosos sem mérito. Ela será dividida, repartida, cindida em pedaços; e não estou usando pleonasmos, os tempos vindouros trarão a derrocada do império; o orgulho sacudirá ou abolirá as distinções, não por virtude, mas por vaidade, e será a vaidade que os fará voltar a elas. Os franceses, semelhantes a crianças brincando com algemas e estilingues, brincarão com títulos, honrarias, condecorações; tudo será um brinquedo para eles, até o uniforme da Guarda Nacional; os gananciosos devorarão as finanças. O déficit atual é de cerca de cinqüenta milhões, em nome do qual está sendo feita a Revolução. Bem! Sob a ditadura dos filantropos, dos retóricos, dos bem-falantes, a dívida do Estado ultrapassará vários milhares de milhões!
Ele se despediu de madame d’Adhémar com as seguintes palavras:
“Desempenharei meu papel mais uma vez e irei deixá-la. Tenho uma viagem até a Suécia; um grande crime está sendo maquinado naquele país, e vou tentar impedi-lo. Sua majestade Gustavo III me interessa, ele vale mais do que a sua reputação.”*
Deixando a pequena capela, o Homem Prodigioso desapareceu! A criada de confiança de madame d’Adhémar, que permanecera à porta da igreja, não viu passar ninguém.
Madame d’Adhémar, aturdida com as palavras de Saint Germain, permaneceu na capela e resolveu não alertar a rainha naquele dia, mas aguardar até o final da semana. Mas então já era tarde demais.
A profecia de Saint Germain cumpriu-se em todos os seus surpreendentes detalhes. Madame d’Adhémar voltou a vê-lo na Place de la Révolution, em 16 de outubro de 1793, na decapitação de Maria Antonieta. O Mestre esteve com ela no fim, assim como estivera com ela desde o começo, zelando pela soberana desde o momento em que ela chegara à França, proveniente da Áustria, para tornar-se a rainha francesa malfadada.**
Em seguida, Saint Germain apoiou Napoleão, em uma última tentativa de estabelecer os Estados Unidos da Europa; o Petit Caporal aceitou o poder de Saint Germain, mas não seus conselhos, procurando utilizá-los em proveito próprio, indo além das instruções do Mestre – e então Saint Germain retirou-se, como já estava acostumado, deixando o ambicioso e temerário Napoleão com sua Waterloo.
Para Saint Germain, este foi o golpe de misericórdia. Sua oportunidade para evitar a retribuição devida a uma era havia passado. Assim, o “Mensageiro Místico” deixou a Europa. A partir daí, até seu retorno, em 1981, a única voz do destino que o continente iria ouvir ou considerar seria a do Carma.
Quando Napoleão era ainda uma criança, Franz Gräffer lembra-se das palavras do conde: ... “É preciso ter estudado nas pirâmides como eu estudei. Ao

*Gustavo III da Suécia, monarca cujo reinado tornou-se conhecido como o Iluminismo sueco, introduziu reformas tais como o livre comércio e a liberdade de imprensa, fortalecendo ao mesmo tempo a monarquia. Na atmosfera criada por uma conspiração aristocrática contra ele, o rei foi mortalmente ferido por um tiro em março de 1792.
**Décima sexta e última filha do imperador do sacro Império Romano, Francisco I e Maria Theresa, Maria Antonieta desposou Luís XVI em bodas de conveniência entre os Habsburgos e os Bourbons, em 1770.
termo deste século, desaparecerei da Europa e dirigir-me-ei para a região dos Himalaias. Repousarei; preciso de repouso. Exatamente daqui a oitenta e cinco anos, as pessoas pousarão novamente os olhos em mim. Adeus, eu os amo.”*
A rejeição a Saint Germain pelas cabeças coroadas da Europa fê-lo partir do mundo visível. E as palavras da lamentação de Jesus poderiam perfeitamente ter sido suas: “Oh, Jerusalém, Jerusalém, tu que mataste os profetas, apedrejaste aqueles que te foram enviados, quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e tu não quiseste!”
Ele mesmo afirma: “Sempre é assim conosco, povo verdadeiro; os impostores são bem-vindos, mas fora com todo aquele que afirmar que isto vai passar!”
Em sua dedicação à causa da liberdade do mundo, Saint Germain trabalhava diligentemente em inúmeras frentes. “Não conseguindo assegurar a atenção da corte de França e de outras cabeças coroadas da Europa”, disse ele, através de seu Mensageiro do século XX, Mark L. Prophet, “voltei-me para o aperfeiçoamento da humanidade em geral, e reconheci existirem muitos que, famintos e sedentos de integridade, seriam de fato preenchidos com o conceito de uma união perfeita, que os inspiraria a dominar o Novo Mundo e a criar uma União entre os estados soberanos. Assim, os Estados Unidos nasceram como um filho de meu coração, e a Revolução Americana constituiu o meio de promover a liberdade em toda a sua glória, manifestando-se de leste a oeste.”
Mesmo antes do colapso na França, Saint Germain já se dedicava à formação de uma união mais perfeita das Treze Colônias. De acordo com a tradição, no dia 4 de julho de 1776, ele influenciou um dos signatários da Declaração da Independência, que proferiu um discurso apaixonado, incentivando os patriotas: “Assinem aquele documento!”
Em reunião em Cambridge, Massachusetts, ele, “o misterioso e velho professor”, inspirou a criação da bandeira. Ao longo da Revolução, ele protegeu o general George Washington e, chegado o momento, ungiu o Mestre Maçom como primeiro presidente dos Estados Unidos da América.

Ver I. Cooper-Oakley, The Comte de St. Germain: The Secret of Kings (Londres: The Theosophical Publishing House Limited, 1912), pp. 1,27-29, 36-38, 42, 43, 50-52, 66-67, 72-73, 87-91, 99, 144-45. Disponível na Summit University Press.
Fiel à sua palavra, Saint Germain reapareceu em fins do século XIX para auxiliar os Mestres M. (El Morya), K.H. (Koot Hoomi) e Seraphis Bey na fundação da Sociedade Teosófica. Na década de 30, Saint Germain entrou em contato com Guy e Edna Ballard e deu-lhes as iniciações e revelações, por eles registradas nos livros Mistérios desvelados, a Presença mágica e os Discursos do eu sou.
Em 1958, o Mestre Ascenso El Morya, em nome de Saint Germain, fundou, através de Mark L. Prophet, The Summit Lighthouse em Washington, D.C., para continuar a publicação dos Ensinamentos em todo o mundo através de cartas chamadas Pérolas de Sabedoria.
Sob os auspícios de The Summit Lighthouse, Saint Germain patrocinou em seguida a Fraternidade dos Guardiães da Chama, oferecendo lições graduadas sobre lei cósmica àqueles que desejassem juntar-se a ele, guardando a Chama da Vida para a humanidade. Saint Germain ditou os Estudos Sobre Alquimia em 1962. Estudos Intermediários Sobre Alquimia surgiram em 1970. Trilogia Sobre a Chama Trina da Vida foi apresentada pelo Mestre como uma transição entre os dois primeiros, enquanto que A Alquimia da Palavra representa a sua tutela sobre as nossas almas, através de revelações e interpretações comunicadas durante os últimos 25 anos de nosso serviço juntos.
Saint Germain, como ele mesmo reconhece, nunca abandonou sua atividade nos bastidores para contatar com almas de luz, não apenas na Europa e na América, mas em todo o mundo. Saint Germain envida esforços incessantes para impedir a Terceira Guerra Mundial, o holocausto nuclear, as previsões terríveis de Nostradamus, os perigos da profecia de Fátima e uma série de males que batem às portas das nações, cujo ribombar faz lembrar a visão de Jesus para esses tempos finais, registrada nos Evangelhos e no Apocalipse.
Se os capitães e os reis, os poderosos e os fracos têm ignorado esse porta-voz da liberdade do mundo – esse alquimista do fogo sagrado por excelência -, os guardiães da chama da liberdade em todas as nações insistem em não esquecê-lo.
Em determinado ponto de sua carreira, perdendo a fé nas classes dominantes e em qualquer capacidade que porventura elas pudessem ter para modificar o rumo da história, ouviu-se Saint Germain exclamar: “Oh, dêem-me dez mil faxineiras, capazes de entregarem-se fielmente à causa! Com elas lhes mostrarei como modificar o mundo com a Verdade Divina.”
E assim foi... Através de pessoas simples, que o Senhor e Abraham Lincoln também amavam, a missão de Saint Germain de promover a liberdade individual, a paz e a iluminação na terra, continua a todo vapor e sem paralelos na história da humanidade. Ele apresenta uma mensagem e um movimento mundial, originário do povo. Ele chama a este movimento sua Revolução iminente da Consciência Superior!
Todos os amantes da liberdade na terra, todos os espíritos estimulados pela chama da liberdade merecem conhecer seu nome, estabelecer contato com seu coração estudar suas obras e apoiar sua causa – que é a causa de todos os povos do planeta Terra.
Com tal propósito, este pequeno livro, A alquimia de Saint Germain, é apresentado ao mundo com a maior alegria neste Dia de Ação de Graças de 1985.
Deus seja louvado por enviar-nos o amado Saint Germain para libertar nossos corações cativos, em nome de Jesus!

Elizabeth Clare Prophet
28 de novembro de 1985 - Retiro do Royal Teton - “onde meu coração está” Montana, EUA.

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